quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

O dia mais feliz da minha vida

Não me lembro quando foi que eu escrevi este texto. Acho que há alguns anos já...Seja como for, tudo merece uma chance, não é? Ele ficou por meses esquecido na minha pen drive que eu achei que tivesse perdido....Hora de aparecer!

O dia mais feliz da minha vida. Este foi o tema da redação proposto pela professora. É claro que com um tema assim, pensei, será fácil escrever. E com o papel e o lápis na mão, me posicionei confortavelmente na cadeira e comecei:

" Me lembro bem do dia mais feliz da minha vida, foi quando…"

Tive que parar. A verdade é que eu imaginava que o dia mais feliz da minha vida seria o do meu nascimento. Provavelmente eu estava feliz por ter vindo a este mundo. Mas quando me pus a escrever, pensei comigo, "como eu poderia estar feliz? Eu nem mesmo sabia que eu existia!" E eu não me lembrava muito bem coisa nenhuma! Ninguém nunca se lembra do dia em que nasceu. Esse dia não servia pra mim, talvez para os meus pais tenha sido um dia feliz, mas para mim, foi só o primeiro dia.

Bom eu poderia começar a minha redação falando de algum dia da minha infância. Qualquer um, mas a minha infância não fora um exemplo muito feliz do que chamam "felicidade de criança". Na verdade minha infância foi bastante sem graça. Eu tive todos os brinquedos que eu quis, mas não podia sair na rua e nem chamar as crianças para brincarem em casa. Minha mãe sempre dizia que era melhor cada criança no seu cantinho. Sem irmãos, pais que trabalhavam o dia todo. Senti raiva ao pensar que minha infância tinha sido uma grande furada! Eu nunca havia escorregado em um barranco sentada num papelão e nunca havia jogado bola na rua. Pipa, carrinhos de rolimã, pião, pega-pega, rouba-bandeira, roda-roda, crianças. Nada disso tinha permeado minha infância. Sempre foram lembranças de meus pais, que eles contavam rindo, e eu me lembro bem que elas muito me entristeciam. Eu nunca fui uma criança completa e feliz. A única coisa que me animava era saber que todos os meus colegas de escola, tinham a mesma e entendiante infância que a minha. Eu não estava sozinha, pelo menos não nesse caso.

Definitivamente, minha infância jamais seria inclusa numa redação sobre felicidade.

De repente o lápis caiu no chão. Eu estava séria, raivosa, quase chorando. Olhei para os lados e vi, surpresa, que muitos já estavam terminando a redação. Outros haviam feito várias datas num papel e estavam se decidindo sobre qual teria sido a mais feliz. Minha colega da frente, Taci, estava agora olhando pra mim e dizendo:

"- Já te contei sobre a noite do acampamento? Ah…Foi uma felicidade só! Mas acho que não ganhou do dia de Natal. Puxa… Foram tantos dias felizes que nem sei sobre qual escrever…O que você acha?"

Eu dei de ombros e respondi com um "ah…você que sabe né?"

Ela nem deu bola e continuou falando, eufórica com tantos dias felizes. Emburrei. Não me lembrava de um único dia que fosse inteiramente feliz. No Natal que poderia ter sido o mais feliz da minha vida, quebrei o braço. No meu aniversário de cinco anos, numa linda chácara, onde tudo parecia perfeito para ser o dia mais feliz do mundo, minha avó morreu! Não tinha nem um dia que poderia ter sido especial, relembrado como um dia muito muito feliz, que eu não tivesse me sentido triste!

E no meio daquele turbilhão de adolescentes eufóricos, escrevendo sobre seus lindos dias felizes, eu simplesmente emburrei! Muito, mas muito infeliz. Como meu tempo estava se esgotando e eu precisava escrever, entreguei o jogo e disse logo toda a verdade. Pra mim não existia essa de "dia mais feliz", mas eu tinha uns bons momentos nas lembranças. Antes de quebrar o braço naquele Natal, eu tinha muita coisa boa pra lembrar daquele mesmo dia. Eu também tive momentos muito felizes brincando com minha mãe ou com meu pai, mesmo que só no finalzinho do dia, quando eles chegavam do serviço. E na escola, eu também tinha ótimas recordações, ainda que nunca fossem todas do mesmo dia. "Eis a verdade", eu escrevi, "o dia mais feliz da minha vida, acho que foi hoje, ou melhor, o momento mais feliz foi agora, porque terminando de escrever, percebo que pude sentir a felicidade de todos aqueles momentos de novo, relembrando cada um deles."

Qual foi minha feliz surpresa, quando, uma semana depois, recebi minha redação com um belo 10 estampado nela! "Ah", pensei, "meu primeiro dez em redação! Hoje é o dia mais feliz da minha vida." E sai pulando, feliz feliz, mesmo sabendo que o dia ainda não tinha terminado e que grande eram as chances de me acontecer uma infelicidade qualquer.